Ele, um desses iguais personagens advindos nas asas da ficção do Cariri, Luiz Carlos Salatiel. Surgido nesse mundo fantástico das terreiradas mágicas do chão nacional dos ancestrais, Luiz invade o salão das festas populares também para movimentar em si próprio a cena luminosa do hemisfério oriental de músicas, artes plásticas, literaturas. Arauto da alegria, sacode maracás do ritual dos caboclos desde tempos atrás, aos turnos dos festivais da canção do Parque Municipal a salões de arte e outras manifestações paralelas.
Depois, dormir ouvindo Luiz entrevistar os mestres Aldeni e Isabel, do Reisado da Vila Lobo, no programa Cariri Encantado da Rádio Educadora, fala de sonhos e viagens a universos da mística fundamental. Mergulhar às raízes da cultura nordestina, fincadas nos alpendres e solos medievais da Península Ibérica, patamares da tradição imorredoura que desfila atores altivos dos grupos de brincantes sob o comando de certos capitães alencarinos. Um tropel de cavaleiros andantes de armaduras luminosas, que percorre praças dos reinos transcendentais, defensores perpétuos de lendas e mitos, cantigas e naus catarinetas varridas ao vento de luas e castelos eternos, sombras rebrilhantes escorrendo nos prados verdes dos torneios, clarins, alazões pendoados e lanças coloridas.
Ainda que mais pretendesse contar das possibilidades impossíveis, falar das peripécias desse personagem ocuparia vasilhas enormes. Bom caráter, atípico, animador, surpreendente, cigano do inesperado, Luiz Carlos reúne vários Luiz Carlos Salatiel de Alencar num só Luiz Carlos. As paredes das programações individuais radiofônicas forçariam reservas para contê-lo num único projeto pessoal sem maiores resultados que dissessem quanto ele representa para nós em termos de artista incansável, paladino das lutas pelos valores infinitos da melhor inspiração.
Veja bem, o conteúdo criativo nesse audaz cavaleiro queima de intensidade o papel dos saltimbancos fellinianos, tipo móvel que brotou no Cariri e escreve, com seu itinerário, parábolas, pautas e andanças incríveis, códigos arcaicos nas encostas circulares da Serra. Viajou longe pela aventura da vida e aqui retornou como ninguém aos feitos da história particular das sagas prodigiosas, em versões assemelhadas às epopéias que reaviva nos roteiros das estradas de gado rompidas na lauta conquista dos sertões, pela Casa da Torre de Garcia D’Ávila.
Antes, há pouco, soube o quanto o repertório de palavras da pessoa acaba devendo para rabiscar com propriedade as contribuições de cada instrumento isolado ao conjunto harmonioso das orquestras. A pena traz dali, ajunta daqui, concentra esforços e nada. Bom, tudo isto na gravação de um comentário dos feitos notáveis de Luiz Carlos Salatiel sempre no propósito de acondicionar para o futuro os frutos culturais da nossa gente.