terça-feira, 2 de junho de 2009

Em Torno de Joaryvar Macedo


Falar da personalidade e, principalmente, da obra literária e historiográfica de Joaryvar Macedo constitui tarefa que dignifica e ao mesmo tempo põe em desafio a argúcia do intérprete, uma vez que se intenta tratar da projeção de um homem de letras que “notabilizou-se como um dos mais autênticos pesquisadores da história do seu Estado”.

Considerado por Raimundo Girão como sendo “o mais abalizado historiador do sul do Ceará”, Joaryvar Macedo nasceu no Sítio Calabaço, a oito quilômetros da cidade de Lavras da Mangabeira, aos 20 de maio de 1937, sendo filho de Antônio Lobo de Macedo, poeta popular e político influente em seu município de origem, e de Maria Torquato Gonçalves de Macedo.

Na terra natal estudou as primeiras letras com as professoras Teresita Bezerra, Irony Gonçalves, Adelice Macedo e Nícia Augusto Gonçalves, entre outras. Posteriormente, foi aluno do Seminário Diocesano do Crato e do Seminário Arquidiocesano de Fortaleza, cursando inclusive Teologia nos Seminários Arquiepiscopais de Olinda, Recife e João Pessoa. Em 1965, ingressou na Faculdade de Filosofia do Crato, por onde licenciou-se em Letras, colocando grau aos 7 de dezembro de 1968, sendo na oportunidade orador oficial da turma, possuindo ainda curso de Pós-Graduação em Metodologia do Ensino Superior pela Universidade Católica de Salvador.

Depois de formado, abraçou a carreira do magistério, que exerceu com proficiência e afinco, principalmente como professor da Faculdade de Filosofia de Crato e de vários estabelecimentos de Ensino de Juazeiro do Norte. Ensaísta e historiador, em 1974 fundou o Instituto Cultural do Vale Caririense, que dirigiu por mais de uma década e do qual foi aclamado presidente perpétuo, dedicando-se como pesquisador aos estudos da formação étnica, histórica e cultural da Região do Cariri.

Sendo admirável “a extensão de sua cultura e a perseverança de suas linhas de pesquisa, qualidades que escondia atrás de uma personalidade simples e de aparência tímida”, como bem acentuou o escritor Murilo Martins, o certo é que Joaryvar Macedo, “revelando uma excepcional tendência para a pesquisa histórica, sua atuação nessa área logo se mostrou tão ampla e profunda, que se passou a ver na projeção do seu trabalho um desdobramento da escola instaurada por Irineu Pinheiro e padre Antônio Gomes de Araújo, fixando-se neste último a sua linha de ação”, consoante o ponto de vista do ensaísta e crítico literário F. S. Nascimento.

Sobre a evidência de ser Joaryvar Macedo o representante mais legítimo e o mais profundo continuador da escola histórica do Cariri, em 1984, no meu livro Leitura e Conjuntura, eu já havia afirmado o seguinte com relação à sua envergadura de intelectual: “Joaryvar Macedo é um escritor inquieto, porém um homem polidamente tratável. É valor maior das letras sul-cearenses no momento atual, porque, quem começar a leitura da história da Região Caririense pelas obras de Irineu Pinheiro, e resvalar pelos ensinamentos do padre Antônio Gomes de Araújo, terá que fatalmente que ancorar nos seus trabalhos históricos sobre a conquista, o povoamento e formação étnica e social do ubertoso vale”.

Além de farta produção esparsa em jornais e revistas do Ceará e de outros Estados, publicou Joaryvar Macedo os seguintes trabalhos: Caderno de Loucuras – 1965; Discurso de Orador Oficial da Turma – 1968; Apresentação de Fagundes Varela – 1971; Os Augustos – 1971; Otacílio Macedo – 1970; Um Bravo Caririense – 1974; O Poeta Lobo Manso – 1975; Templos, Engenhos, Fazendas, Sítios e Lugares – 1975; A Estirpe da Santa Teresa – 1976; Pedro Bandeira, Príncipe dos Poetas Populares – 1976; Fagundes Varela e Outros Rabiscos – 1978; Influência de Portugal na Formação Étnica e Social do Cariri – 1978; Origens de Juazeiro do Norte – 1978; Presença Inconcurssa de Norte-Rio-Grandenses na Colonização do Cariri – 1979; Composições Poéticas de Hermes Carleial – 1979; O Contigente Paraibano na Colonização do Cariri – 1980; Autores Caririenses – 1981; Lavras da Mangabeira – dos Primórdios a Vila – 1981; Alencar Peixoto, Um Clássico – 1981; Pernambuco nas Origens do Cariri – 1981; Orações Acadêmicas – 1983; O Talento Poético de Alencar e Outros Estudos – 1984; São Vicente das Lavras – 1984; Um Vernaculista e um Poeta – 1985; Povoamento e Povoadores do Cariri Cearense – 1985; Discursos Acadêmicos – 1986; Lavras da Mangabeira – 1986; Temas Históricos Regionais – 1986; Ocorrências e Personagens – 1987; Antônio Lobo de Macedo: o Homem e o Poeta – 1988; Império do Bacamarte – 1990; Ensaios e Perfis – 2001; e Na Esfera das Letras – 2009.

Da bibliografia acima, dois livros tão-somente seriam suficientes para dignificar a reputação de Joaryvar Macedo como um dos mais eruditos historiadores do Ceará. Trata-se de A Estirpe da Santa Teresa e de Império do Bacamarte, sem a necessidade de outros comentários, bastando apenas mencionar que, com essa última obra, Joaryvar Macedo “estabeleceria um novo marco na historiografia política no nosso Estado, oferecendo aos cientistas dessa área e aos estudiosos dessa temática sociológica, o mais completo ensaio do gênero até hoje escrito no Nordeste brasileiro”, segundo a opinião abalizada do escritor F. S. Nascimento, com a qual inteiramente concordamos.

Joaryvar Macedo consolidou sua formação cultural estabelecido numa região e tratando quase que exclusivamente da temática histórica do Cariri, o que não o impediu de ter “uma visão histórica do Brasil através da região em que viveu”. Em 1983 transferiu-se para Fortaleza, indo inicialmente ocupar as funções de assessor especial do Presidente do Conselho de Educação do Ceará. Em seguida, viria a exercer as funções de Secretário de Cultura e Desporto do Estado do Ceará e as de Presidente do Conselho Estadual de Cultura, tendo em 1986 sido eleito para a Academia Cearense de Letras e posteriormente para o quadro dos sócios efetivos do Instituto do Ceará.

Professor da Universidade Regional do Cariri/URCA e chefe do seu Escritório em Fortaleza, Joaryvar Macedo foi ainda membro do Conselho Estadual de Educação. Foi, outrossim, um dos raros escritores cearenses a ser agraciado, pelo Governo do Estado, com a Medalha José de Alencar, honraria máxima a que um intelectual pode aspirar na Terra de Iracema.

Sócio efetivo, correspondente ou honorário de várias instituições culturais, nacionais e internacionais, e detentor de vários tributos e comendas, Jorayvar Macedo faleceu em Fortaleza, aos 29 de janeiro de 1991, constituindo a sua morte prematura, uma das maiores tragédias que se abateram sobre o desenvolvimento da historiografia cearense.

Em vida, foi Joaryvar Macedo a própria história do Cariri se movimentando, se expressando em gestos e palavras, se dimensionando nas páginas dos livros e opúsculos que nos legou e nos trabalhos esparsos respingados na imprensa caririense e na Revista do Instituto do Ceará, cujas páginas enriqueceu com a originalidade e a percuciência das suas muitas observações.

“Homem calmo, de sólida cultura, não sabe fazer alarde pessoal dos seus conhecimentos. É valor autêntico da cultura caririense que começa a espraiar-se por aí afora”. Dele disse o saudoso escritor J.de Figueiredo Filho quando, em data solene para a história das letras sul-cearenses, o recebeu como membro efetivo do Instituto Cultural do Cariri.

Sem nenhuma dúvida foi Joaryvar Macedo uma das personalidades mais ilustres das letras cearenses e um dos mais eruditos historiadores do Ceará, cuja formação histórica pesquisou com a argúcia e o devotamento de um beneditino.

Em todos os seus trabalhos de pesquisa Joaryvar Macedo primou por um estilo eloqüente. E sempre que expendiu juízos em torno de fatos históricos o fez com a melhor clareza de raciocínio. A sua linguagem literária revela-se, em todo o seu percurso, recheada de filamentos retóricos, demonstrando-nos o seu autor possuir a dotação de um clássico, sendo ele um moderno.

Dimas Macedo