quarta-feira, 13 de outubro de 2010

RAÍZES DA VIOLÊNCIA - Emerson Monteiro

Vive-se período extremo de criminalidade violenta, isso em todo o mundo, com ênfase nos países mais atrasados, dentre eles o Brasil e toda a América Latina. Antes, o motivo alegado se voltava para as revoluções, na época da chamada Guerra Fria.
Hoje, qualquer motivo preenche as justificativas das convulsões sociais, desde a delinquência juvenil ao tráfico de drogas, passando pelos bolsões de pobreza e guerras tribais, lutas raciais, onde o padrão da cultura indica descompasso, perversidade e miséria.
Houve tempo quando era mais fácil encontrar as razões da insegurança. O atraso das mentalidades, as conquistas coloniais, disputas imperialistas, domínio das terras, fanatismo religioso. Tudo servia de pretexto, no decantado anseio do homem lobo do próprio homem. Ou de querer a paz e se preparar para a guerra.
Acham as autoridades que o problema se revolverá mediante a ampliação dos órgãos de segurança, aquisição de armamentos, modernização e ampliação das penitenciárias, maior remuneração dos efetivos policiais, etc., etc.
Contudo a questão possui raízes mais profundas. Suas causas merecem detalhamento, porquanto procedem das origens, que acumulam estudos e pouquíssimo tratamento.
Conceitos de que falta educação ao povo e que a tradição nacional dos degredados, escravos e índios, sem amadurecimento suficiente, formaram país aleijado, por si não justificam a violência das ruas, o clima tenso em que se transformou o sonho urbano.
De suas causas mais evidentes cabe citar o desemprego, sem esperança de redução para a juventude, que, todo dia, chega ao mercado de trabalho. A excessiva concentração da riqueza nas mãos de poucos, há séculos donos de bens. E a pobreza infinita das massas alienadas pela educação burguesa.
Enquanto sofre a nacionalidade esse atraso crônico na moralidade e competência dos dirigentes responsáveis pela administração pública, em todos os segmentos eles jamais se comprometem com mudanças substanciais e inadiáveis.
Como se não bastassem ditas origens, persiste, na estrutura mundial, um conceito voltado aos interesses das nações ricas, que investem pesado na manutenção do poder através dos sistemas de exploração financeira. Gastam fortunas para técnicas de preservação dos territórios da ordem injusta.
Portanto, para neutralizar o clima superlativo desse drama, cabem atitudes aos que precisam se livrar das nuvens escuras dessa história reacionária, com criatividade, maior comprometimento e participação coletiva dos grupos prejudicados, união das classes exploradas e conscientização política.
Abrir o olho e enxergar que só a educação trará mudanças significativas, após os esforços da sociedade, que será instrumento da democracia através do voto consciente que fala alto neste assunto, desde que assim pretendam os eleitores, bola da vez na decisão de cada eleição.

MATÉRIA DO DIÁRIO DO NORDESTE

Batista de Lima


12/10/2010
Histórias para contar

A universalidade desta história ocorre no momento em que Genivaldo não é resgatado sozinho, pois nossa mente de leitor expande suas peripécias a todos aqueles que como ele foram vítimas do êxodo rural e retirantes se tornaram

Histórias para contar e poemas de meu viver é o título deste livro de Fátima Lemos. Vou ficar com as histórias, visto que os poemas são de circunstância, dirigidos a pessoas do seu afeto, o que os torna particulares, afastando-os da característica de universalidade poética. Assim, poderíamos ter dois livros, um de prosa e outro de versos. Afinal, Fátima Lemos é narradora. Mesmo contando histórias de personalidades que lhe são próximas, ela alcança esse patamar de universalidade que é fundamental em literatura.

No começo do livro ela afirma: "o presente livro é fruto das ligações que mantenho com a minha terra e com o meu povo. Não tive a pretensão de abordar todos os aspectos históricos e psicológicos a respeito dos personagens". Ora, aí já está a importância de seus escritos, por primeiro cantar o seu entorno para depois cantar o mundo. Mas cantar o seu quintal é guindá-lo para cavalgar as distâncias e atingir os mais diversos leitores. Isso ela consegue ao colocar no mapa mundi seu sítio de nascença, a Carnaubinha. Isso ocorre ao narrar a saga de Genivaldo da Franca Crispim. Genivaldo não seria ninguém, universalmente falando, se não existisse o texto de Fátima Lemos, simplesmente para narrar seus passos de figura picaresca, feito um Quixote tupiniquim, circulando por este Brasil de mãe Chica e Pai João, sem saber quem é nem para onde vai.

A história de Genivaldo é pungente e passaria em branco para nós outros, não fosse a perspicácia de Fátima em escrevê-la. De uma página branca, sua heroica história passa para a página escrita e ele é resgatado das florestas amazônicas e do esquecimento, para habitar majestoso e santificado na nossa memória leitora. Genivaldo resgatado não vem só, pois traz consigo uma infinidade de nordestinos que também foram engolidos pelo mesmo destino seu, mas que não tiveram a sorte de ter uma escritora que lhes acompanhasse os passos. A universalidade desta história ocorre no momento em que Genivaldo não é resgatado sozinho, pois nossa mente de leitor expande suas peripécias a todos aqueles que como ele foram vítimas do êxodo rural e retirantes se tornaram.

Essa história é mais um grito de alerta para esse esvair-se de arigós, paus-de-arara, candangos que produzimos nesta terra lacerada, nordestinada e massacrada pela desigualdade social, pelo latifúndio improdutivo e pela politicagem corrupta. Como leitor, jamais vou esquecer essa figura martirizada que foi Genivaldo da Franca Crispim.

A segunda história, contrária à primeira, é curiosa pelo fato de que é uma mulher valente, rica e poderosa que domina um município inteiro e impõe respeito em toda a região caririense e no alto do Salgado. Fideralina Augusto Lima é um exemplo para as mulheres e uma lição para os homens. Fez e desfez em sua Lavras da Mangabeira. Deixou seu nome na história cearense. Virou até folclore através de suas posições fortes, seu mandonismo, seu bacamarte e os cabras a seu serviço. Fátima Lemos levou-nos mais uma vez ao sítio Tatu e nos impôs a condição de pedir vênia para adentrar o casarão de Fidera, debaixo de muito respeito a essa prima dona do coronelismo cearense.

Outra Fideralina, abordada pela escritora, é Sinhá D´Amora. Isso porque seu nome de batismo é Fideralina Corrêa Amora Maciel, neta da matriarca homônima. Essa, como sua avó, não ficou no Tatu, se impondo pela força do trabuco. Sua arma foi o pincel, seu bacamarte pincelou as mais belas imagens que a levaram às galerias mais distantes e hoje enriquecem museus daqui e d´alhures. Fátima Lemos nos fez admirar cada vez mais essa artista plástica que Lavras da Mangabeira emprestou ao mundo.

Em seguida, a autora conta a trajetória de seu tio e professor Paulo Crispim de Sousa. Narra o heroísmo desse mangabeirense que vindo de origem humilde, galgou as glórias do magistério e serviu de exemplo, como educador, para toda uma geração de conterrâneos que lhe seguiram os passos. Até politicamente Paulo Crispim foi exemplo e como orador deixou um estilo a ser seguido.

Finalmente, Fátima Lemos faz um levantamento genealógico da família Pereira de Sousa. Nesse momento ela se empenha em dinamizar a pacata vida de seus ancestrais, do mais antigo ao seu pai querido. Nessa trajetória ela imprime uma ternura particular ao se referir àquele clã que construiu sua história, lavrando a terra, temendo a Deus, e amando os circunstantes. Essa família tipicamente nordestina ao ser retratada leva consigo para o universo do leitor um retrato de todas as famílias desta nossa região. É, pois, esse poder de universalizar suas histórias, que faz de Fátima Lemos uma narradora que nos arrasta para a leitura de seus escritos e nos coloca como personagem cada vez mais ativo dessa sofrida nação nordestina.